Revolucionar

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quarta-feira, 16 de novembro de 2011

No Parque Zucotti, a polícia protegeu o 1%

Às 04h em Lower Manhattan, conforme os restos do que sobrou do acampamento do Occupy Wall Street são colocados em caminhões de lixo, alguns manifestantes ainda não desistiram da polícia. Kevin Sheneberger tenta envolver um policial em um sério debate sobre o papel das forças de segurança em protestos populares. Enquanto isso, ele vê a barraca de um colega sendo jogada fora. Atrás dele, uma garota segura um cartaz com os dizeres: "NYPD, nós confiávamos em vocês – vocês deveriam nos proteger!"

O sentimento é familiar. Na Europa, após um ano de manifestações, ocupações e desobediência civil, manifestantes contrários aos planos de austeridade alteraram o discurso de apoio aos policiais – trabalhadores cujos empregos e aposentadorias também estão sob ameaça – para um de revolta e raiva contra a violência cometida contra civis desarmados. Após a brutalidade da polícia mês passado, em Oakland, e a recente desocupação do acampamento do Occupy Wall Street, ativistas norte-americanos também estão chegando à conclusão que “a polícia protege o 1%".

A noção de que as forças policiais estão lá para proteger uma elite econômica do resto da população não é novidade para as minorias étnicas carentes, muitas delas submetidas a intimidações em suas comunidades por anos, mas para aqueles vindos de estruturas mais abastadas, o primeiro spray de pimenta é um ensinamento importante da relação entre o Estado e os cidadãos no Ocidente. “Para quem vocês trabalham?”, grita um manifestantes em Manhattan, enquanto a polícia carrega uma van com objetos. “Vocês trabalham para o banco JP Morgan!”

Em tempos de crise econômica e democrática, faz sentido que governos hesitantes usem a violência policial e a ameaça de prisão para ameaçar cidadãos. No contexto das manifestações, no entanto, o assédio da polícia tem outros três importantes efeitos. O primeiro e mais importante é a conscientização.

O espetáculo da polícia que espanca e brutaliza civis desarmados pelo crime de sentar na calçada e de pedir um mundo melhor traz para casa o fato de que a luta do público e dos manifestantes é a mesma. O segundo é a galvanização: ataques contra pacifistas quase sempre fazem a polícia e o governo parecerem fracos e covardes, e geralmente levam a uma escalada do apoio popular à desobediência civil. “Isso agora vai explodir”, afirmou Katie, de 26 anos, conforme assistíamos os manifestantes saírem do Parque Zucotti, um atrás do outro. “Eles não têm ideia do que fizeram.”

Combater a polícia pode canalizar a energia do movimento – mas pode também secá-la. No Reino Unido, um ano de prisões e repressão violenta deixou os manifestantes contrários aos cortes de gastos debilitados e esgotados, e o desafio para o movimento nos EUA será o de lembrar seu objetivo frente à ação da polícia. “Esse é o ponto principal da resistência não violenta”, disse Sheneberger. "Expor a corrupção do poder que está te combatendo.”

*Artigo reproduzido pelo The Nation
fonte:http://operamundi.uol.com.br

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

DOIS PESOS......


Os candidatos à presidência da república José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) se cumprimentam durante debate eleitoral em setembro de 2010.

***
Este jornal (O Estado de S Paulo) teve uma atitude que considero digna: explicitou aos leitores que apoia o candidato Serra na presente eleição. Fica assim mais honesta a discussão que se faz em suas páginas. O debate eleitoral que nos conduzirá às urnas amanhã está acirrado. Eleitores se declaram exaustos e desiludidos com o vale-tudo que marcou a disputa pela Presidência da República. As campanhas, transformadas em espetáculo televisivo, não convencem mais ninguém. Apesar disso, alguma coisa importante está em jogo este ano. Parece até que temos luta de classes no Brasil: esta que muitos acreditam ter sido soterrada pelos últimos tijolos do Muro de Berlim. Na TV a briga é maquiada, mas na internet o jogo é duro.

Se o povão das chamadas classes D e E – os que vivem nos grotões perdidos do interior do Brasil – tivesse acesso à internet, talvez se revoltasse contra as inúmeras correntes de mensagens que desqualificam seus votos. O argumento já é familiar ao leitor: os votos dos pobres a favor da continuidade das políticas sociais implantadas durante oito anos de governo Lula não valem tanto quanto os nossos. Não são expressão consciente de vontade política. Teriam sido comprados ao preço do que parte da oposição chama de bolsa-esmola.

Uma dessas correntes chegou à minha caixa postal vinda de diversos destinatários. Reproduzia a denúncia feita por “uma prima” do autor, residente em Fortaleza. A denunciante, indignada com a indolência dos trabalhadores não qualificados de sua cidade, queixava-se de que ninguém mais queria ocupar a vaga de porteiro do prédio onde mora. Os candidatos naturais ao emprego preferiam viver na moleza, com o dinheiro da Bolsa-Família. Ora, essa. A que ponto chegamos. Não se fazem mais pés de chinelo como antigamente. Onde foram parar os verdadeiros humildes de quem o patronato cordial tanto gostava, capazes de trabalhar bem mais que as oito horas regulamentares por uma miséria? Sim, porque é curioso que ninguém tenha questionado o valor do salário oferecido pelo condomínio da capital cearense. A troca do emprego pela Bolsa-Família só seria vantajosa para os supostos espertalhões, preguiçosos e aproveitadores se o salário oferecido fosse inconstitucional: mais baixo do que metade do mínimo. R$ 200 é o valor máximo a que chega a soma de todos os benefícios do governo para quem tem mais de três filhos, com a condição de mantê-los na escola.

Outra denúncia indignada que corre pela internet é a de que na cidade do interior do Piauí onde vivem os parentes da empregada de algum paulistano, todos os moradores vivem do dinheiro dos programas do governo. Se for verdade, é estarrecedor imaginar do que viviam antes disso. Passava-se fome, na certa, como no assustador Garapa, filme de José Padilha. Passava-se fome todos os dias. Continuam pobres as famílias abaixo da classe C que hoje recebem a bolsa, somada ao dinheirinho de alguma aposentadoria. Só que agora comem. Alguns já conseguem até produzir e vender para outros que também começaram a comprar o que comer. O economista Paul Singer informa que, nas cidades pequenas, essa pouca entrada de dinheiro tem um efeito surpreendente sobre a economia local. A Bolsa-Família, acreditem se quiserem, proporciona as condições de consumo capazes de gerar empregos. O voto da turma da “esmolinha” é político e revela consciência de classe recém-adquirida.

O Brasil mudou nesse ponto. Mas ao contrário do que pensam os indignados da internet, mudou para melhor. Se até pouco tempo alguns empregadores costumavam contratar, por menos de um salário mínimo, pessoas sem alternativa de trabalho e sem consciência de seus direitos, hoje não é tão fácil encontrar quem aceite trabalhar nessas condições. Vale mais tentar a vida a partir da Bolsa-Família, que apesar de modesta, reduziu de 12% para 4,8% a faixa de população em estado de pobreza extrema. Será que o leitor paulistano tem ideia de quanto é preciso ser pobre, para sair dessa faixa por uma diferença de R$ 200? Quando o Estado começa a garantir alguns direitos mínimos à população, esta se politiza e passa a exigir que eles sejam cumpridos. Um amigo chamou esse efeito de “acumulação primitiva de democracia”.

Mas parece que o voto dessa gente ainda desperta o argumento de que os brasileiros, como na inesquecível observação de Pelé, não estão preparados para votar. Nem todos, é claro. Depois do segundo turno de 2006, o sociólogo Hélio Jaguaribe escreveu que os 60% de brasileiros que votaram em Lula teriam levado em conta apenas seus próprios interesses, enquanto os outros 40% de supostos eleitores instruídos pensavam nos interesses do País. Jaguaribe só não explicou como foi possível que o Brasil, dirigido pela elite instruída que se preocupava com os interesses de todos, tenha chegado ao terceiro milênio contando com 60% de sua população tão inculta a ponto de seu voto ser desqualificado como pouco republicano.

Agora que os mais pobres conseguiram levantar a cabeça acima da linha da mendicância e da dependência das relações de favor que sempre caracterizaram as políticas locais pelo interior do País, dizem que votar em causa própria não vale. Quando, pela primeira vez, os sem-cidadania conquistaram direitos mínimos que desejam preservar pela via democrática, parte dos cidadãos que se consideram classe A vem a público desqualificar a seriedade de seus votos.
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Maria Rita Kehl é psicanalista, doutora em psicanálise pela PUC de São Paulo, poeta e ensaísta.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

O capitalismo chegou ao fim da linha (Immanuel Wallerstein)

       A entrevista durou pouco mais de onze minutos, mas alimentará horas de debates em todo o mundo e certamente ajudará a enxergar melhor o período tormentoso que vivemos. Aos 81 anos, o sociólogo estadunidense Immanuel Wallerstein, acredita que o capitalismo chegou ao fim da linha: já não pode mais sobreviver como sistema. Mas – e aqui começam as provocações – o que surgirá em seu lugar pode ser melhor (mais igualitário e democrático) ou pior (mais polarizado e explorador) do que temos hoje em dia.
Estamos, pensa este professor da Universidade de Yale e personagem assíduo dos Fóruns Sociais Mundiais, em meio a uma bifurcação, um momento histórico único nos últimos 500 anos. Ao contrário do que pensava Karl Marx, o sistema não sucumbirá num ato heróico. Desabará sobre suas próprias contradições. Mas atenção: diferente de certos críticos do filósofo alemão, Wallerstein não está sugerindo que as ações humanas são irrelevantes.

        Ao contrário: para ele, vivemos o momento preciso em que as ações coletivas, e mesmo individuais, podem causar impactos decisivos sobre o destino comum da humanidade e do planeta. Ou seja, nossas escolhas realmente importam. “Quando o sistema está estável, é relativamente determinista. Mas, quando passa por crise estrutural, o livre-arbítrio torna-se importante.”

       É no emblemático 1968, referência e inspiração de tantas iniciativas contemporâneas, que Wallerstein situa o início da bifurcação. Lá teria se quebrado “a ilusão liberal que governava o sistema-mundo”. Abertura de um período em que o sistema hegemônico começa a declinar e o futuro abre-se a rumos muito distintos, as revoltas daquele ano seriam, na opinião do sociólogo, o fato mais potente do século passado – superiores, por exemplo, à revolução soviética de 1917 ou a 1945, quando os EUA emergiram com grande poder mundial.

      As declarações foram colhidas no dia 4 de outubro pela jornalista Sophie Shevardnadze, que conduz o programa Interview na emissora de televisão russa RT. A transcrição e a tradução para o português são iniciativas do sítio Outras Palavras, 15-10-2011.

Eis a entrevista.
       Há exatamente dois anos, você disse ao RT que o colapso real da economia ainda demoraria alguns anos. Esse colapso está acontecendo agora?
Não, ainda vai demorar um ano ou dois, mas está claro que essa quebra está chegando.

Quem está em maiores apuros: Os Estados Unidos, a União Europeia ou o mundo todo?
Na verdade, o mundo todo vive problemas. Os Estados Unidos e União Europeia, claramente. Mas também acredito que os chamados países emergentes, ou em desenvolvimento – Brasil, Índia, China – também enfrentarão dificuldades. Não vejo ninguém em situação tranquila.

Você está dizendo que o sistema financeiro está claramente quebrado. O que há de errado com o capitalismo contemporâneo?
Essa é uma história muito longa. Na minha visão, o capitalismo chegou ao fim da linha e já não pode sobreviver como sistema. A crise estrutural que atravessamos começou há bastante tempo. Segundo meu ponto de vista, por volta dos anos 1970 – e ainda vai durar mais uns vinte, trinta ou quarenta anos. Não é uma crise de um ano, ou de curta duração: é o grande desabamento de um sistema. Estamos num momento de transição. Na verdade, na luta política que acontece no mundo — que a maioria das pessoas se recusa a reconhecer — não está em questão se o capitalismo sobreviverá ou não, mas o que irá sucedê-lo. E é claro: podem existir dois  pontos de vista extremamente diferentes sobre o que deve tomar o lugar do capitalismo.

Qual a sua visão?
Eu gostaria de um sistema relativamente mais democrático, mais relativamente igualitário e moral. Essa é uma visão, nós nunca tivemos isso na história do mundo – mas é possível. A outra visão é de um sistema desigual, polarizado e explorador. O capitalismo já é assim, mas pode advir um sistema muito pior que ele. É como vejo a luta política que vivemos. Tecnicamente, significa é uma bifurcação de um sistema.

Então, a bifurcação do sistema capitalista está diretamente ligada aos caos econômico?
Sim, as raízes da crise são, de muitas maneiras, a incapacidade de reproduzir o princípio básico do capitalismo, que é a acumulação sistemática de capital. Esse é o ponto central do capitalismo como um sistema, e funcionou perfeitamente bem por 500 anos. Foi um sistema muito bem sucedido no que se propõe a fazer. Mas se desfez, como acontece com todos os sistemas.

Esses tremores econômicos, políticos e sociais são perigosos? Quais são os prós e contras?
Se você pergunta se os tremores são perigosos para você e para mim, então a resposta é sim, eles são extremamente perigosos para nós. Na verdade, num dos livros que escrevi, chamei-os de “inferno na terra”. É um período no qual quase tudo é relativamente imprevisível a curto prazo – e as pessoas não podem conviver com o imprevisível a curto prazo. Podemos nos ajustar ao imprevisível no longo prazo, mas não com a incerteza sobre o que vai acontecer no dia seguinte ou no ano seguinte. Você não sabe o que fazer, e é basicamente o que estamos vendo no mundo da economia hoje. É uma paralisia, pois ninguém está investindo, já que ninguém sabe se daqui a um ano ou dois vai ter esse dinheiro de volta. Quem não tem certeza de que em três anos vai receber seu dinheiro, não investe – mas não investir torna a situação ainda pior. As pessoas não sentem que têm muitas opções, e estão certas, as opções são escassas.

Então, estamos nesse processo de abalos, e não existem prós ou contras, não temos opção, a não ser estar nesse processo. Você vê uma saída?
Sim! O que acontece numa bifurcação é que, em algum momento, pendemos para um dos lados, e voltamos a uma situação relativamente estável. Quando a crise acabar, estaremos em um novo sistema, que não sabemos qual será. É uma situação muito otimista no sentido de que, na situação em que nos encontramos, o que eu e você fizermos realmente importa. Isso não acontece quando vivemos num sistema que funciona perfeitamente bem. Nesse caso, investimos uma quantidade imensa de energia e, no fim, tudo volta a ser o que era antes. Um pequeno exemplo. Estamos na Rússia. Aqui aconteceu uma coisa chamada Revolução Russa, em 1917. Foi um enorme esforço social, um número incrível de pessoas colocou muita energia nisso. Fizeram coisas incríveis, mas no final, onde está a Rússia, em relação ao lugar que ocupava em 1917? Em muitos aspectos, está de volta ao mesmo lugar, ou mudou muito pouco. A mesma coisa poderia ser dita sobre a Revolução Francesa.

O que isso diz sobre a importância das escolhas pessoais?
A situação muda quando você está em uma crise estrutural. Se, normalmente, muito esforço se traduz em pouca mudança, nessas situações raras um pequeno esforço traz um conjunto enorme de mudanças – porque o sistema, agora, está muito instável e volátil. Qualquer esforço leva a uma ou outra direção. Às vezes, digo que essa é a “historização” da velha distinção filosófica entre determinismo e livre-arbítrio. Quando o sistema está relativamente estável, é relativamente determinista, com pouco espaço para o livre-arbítrio. Mas, quando está instável, passando por uma crise estrutural, o livre-arbítrio torna-se importante. As ações de cada um realmente importam, de uma maneira que não se viu nos últimos 500 anos. Esse é meu argumento básico.

Você sempre apontou Karl Marx como uma de suas maiores influências. Você acredita que ele ainda seja tão relevante no século 21?
Bem, Karl Marx foi um grande pensador no século 19. Ele teve todas as virtudes, com suas ideias e percepções, e todas as limitações, por ser um homem do século 19. Uma de suas grandes limitações é que ele era um economista clássico demais, e era determinista demais. Ele viu que os sistemas tinham um fim, mas achou que esse fim se dava como resultado de um processo de revolução. Eu estou sugerindo que o fim é reflexo de contradições internas. Todos somos prisioneiros de nosso tempo, disso não há dúvidas. Marx foi um prisioneiro do fato de ter sido um pensador do século 19; eu sou prisioneiro do fato de ser um pensador do século 20.

Do século 21, agora.
É, mas eu nasci em 1930, eu vivi 70 anos no século 20, eu sinto que sou um produto do século 20. Isso provavelmente se revela como limitação no meu próprio pensamento.

Quanto – e de que maneiras – esses dois séculos se diferem? Eles são realmente tão diferentes?
Eu acredito que sim. Acredito que o ponto de virada deu-se por volta de 1970. Primeiro, pela revolução mundial de 1968, que não foi um evento sem importância. Na verdade, eu o considero o evento mais significantes do século 20. Mais importante que a Revolução Russa e mais importante que os Estados Unidos terem se tornado o poder hegemônico, em 1945. Porque 1968 quebrou a ilusão liberal que governava o sistema mundial e anunciou a bifurcação que viria. Vivemos, desde então, na esteira de 1968, em todo o mundo.

Você disse que vivemos a retomada de 68 desde que a revolução aconteceu. As pessoas às vezes dizem que o mundo ficou mais valente nas últimas duas décadas. O mundo ficou mais violento?
Eu acho que as pessoas sentem um desconforto, embora ele talvez não corresponda à realidade. Não há dúvidas de que as pessoas estavam relativamente tranquilas quanto à violência em 1950 ou 1960. Hoje, elas têm medo e, em muitos sentidos, têm o direito de sentir medo.

Você acredita que, com todo o progresso tecnológico, e com o fato de gostarmos de pensar que somos mais civilizados, não haverá mais guerras? O que isso diz sobre a natureza humana?
Significa que as pessoas estão prontas para serem violentas em muitas circunstâncias. Somos mais civilizados? Eu não sei. Esse é um conceito dúbio, primeiro porque o civilizado causa mais problemas que o não civilizado; os civilizados tentam destruir os bárbaros, não são os bárbaros que tentam destruir os civilizados. Os civilizados definem os bárbaros: os outros são bárbaros; nós, os civilizados.

É isso que vemos hoje? O Ocidente tentando ensinar os bárbaros de todo o mundo?
É o que vemos há 500 anos.

FONTE:http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/wallerstein-o-capitalismo-chegou-ao-fim-da-linha.html

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Para entender as questões das DÍVIDAS X CRISE MUNDIAL.

CARTA DE BRASÍLIA

Seminário Internacional “Alternativas de Enfrentamento à Crise”


Hoje, dia 5 de outubro de 2011, centenas de representantes de entidades do Brasil, Argentina, Belgica, Colombia, Venezuela, Suíça, Noruega, Grécia, Equador, Uruguai, Peru, Bolivia, da Auditoria Cidadã da Dívida e das redes internacionais CADTM (Comitê pela Anulação da Dívida do Terceiro Mundo) e Latindadd (Rede Latino-americana sobre Dívida, Desenvolvimento e Direitos) se reuniram em Brasília, no Seminário Internacional “Alternativas de Enfrentamento à Crise”, para demandar:
- a alteração radical do atual sistema financeiro global, que tem funcionado de forma desregulada, sem qualquer controle democrático ou popular, a despeito das crises financeiras serem sentidas pelos amplos e vulneráveis segmentos sociais;
- a instalação de comissões para auditoria da dívida pública em cada país, e o fim da emissão de dívida pública para salvar instituições financeiras em risco de quebra;
- o avanço da integração latino-americana e a implantação imediata, em toda a região, da Nova Arquitetura Financeira, que inclui o pleno funcionamento do Banco do Sul.

As entidades repudiam os nefastos efeitos das políticas impostas pelos bancos e seus representantes – FMI, União Européia e governos – sobre as populações, com destaque para a Grécia, palco de verdadeira guerra travada entre o povo e o sistema financeiro.

Este sistema insiste em exigir demissões em massa e a redução sem precedentes de direitos e gastos sociais: congelamento salarial, desemprego, penúria dos aposentados, privatizações, precariedade da saúde, educação, moradia, tudo isto para garantir o pagamento de uma dívida repleta de ilegitimidades. Esta é uma crise que multiplica-se tal qual um vírus, que vem adoecendo e contaminando a sociedade.

A crise oferece oportunidade de luta conjunta dos povos do Sul e do Norte contra o “sistema da dívida”, que é a usurpação do endividamento público, transformando-o em um instrumento de dominação global. Além das manifestações públicas evidenciadas por greves em várias partes do mundo, a demanda e a criação de comissões de auditoria da dívida se multiplicam por vários países. A auditoria é um instrumento capaz de revelar e documentar a VERDADE sobre esse “sistema da dívida”, possibilitando à sociedade o CONHECIMENTO sobre como, e a serviço de quem, tais dívidas foram constituídas. E estamos certos de que o conhecimento é um dos principais instrumentos dos povos na luta contra a sua opressão.

O instrumento de auditoria foi utilizado recentemente com sucesso pelo Equador que, com base em relatório de comissão criada para esse fim, respaldado em documentos e provas de ilegalidades, anulou 70% da dívida com bancos privados internacionais. Este processo foi considerado como um exemplo para o mundo pela própria ONU, onde a sociedade poderia estimular a criação de uma comissão de auditoria independente.

No Brasil, recente Comissão Parlamentar de Inquérito da Dívida Pública, concluída em 2010, na Câmara dos Deputados, também apontou fortes indícios de ilegalidades – já encaminhados ao Ministério Público - e reconheceu que a maior parte da dívida pública brasileira é resultado das altas taxas de juros, o que demonstra ausência de contrapartida real de uma dívida que em 2010 consumiu 45% dos recursos do Orçamento da União para o pagamento de juros e amortizações. Essa dívida, gerada por mecanismos financeiros ilegais e ilegítimos, entre os quais até mesmo a prática de juros sobre juros (anatocismo) já declarada ilícita pelo Supremo Tribunal Federal - STF, deve ser urgentemente auditada.

Justamente no STF se encontra a ação ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) - Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 59/2004 - que pleiteia o cumprimento do artigo 26 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988. Esse artigo determinou que o Congresso Nacional constitua uma Comissão Mista para realizar o exame analítico e pericial dos atos e fatos geradores do endividamento brasileiro. Hoje, 5 de outubro de 2011, completam-se exatos 23 anos de sistemático descumprimento desse dispositivo contido na Lei Maior do país, proclamada para ser a “Constituição Cidadã”. As entidades presentes no Seminário repudiam essa continuada violação e declaram seu apoio à importante iniciativa da OAB, e às investigações do Ministério Público decorrentes da CPI da Dívida.

A auditoria da dívida é urgente, pois o Brasil também enfrenta uma séria crise de endividamento, ainda que não aparente. O atual modelo econômico aplicado no país privilegia o pagamento da dívida ao mesmo tempo em que aplica todas as medidas recomendadas pelo FMI na Europa. Estão em marcha no Brasil o corte de R$ 50 bilhões no orçamento federal; o congelamento de salários de servidores públicos, proposto pelo Projeto de Lei Complementar 549/2009, e já implementado na prática pela recusa do governo em negociar com várias categorias; a privatização da previdência desses servidores (Projeto de Lei 1992/2007); a privatização dos hospitais universitários (Projeto de Lei 1749/2011); a restrição de recursos para investimentos em áreas essenciais como saúde, educação, moradia, assistência, saneamento etc.

Os participantes do Seminário declaram também seu apoio à recomposição das perdas dos aposentados, bem como à campanha pela destinação de 10% do PIB para a educação, e demais revindicações que visam a resgatar os direitos sociais.

Repudiamos a intenção anunciada de que o Brasil poderá destinar recursos para “ajudar” a União Européia (UE) a “combater” a crise, acenando com o aporte de mais reservas internacionais brasileiras para o FMI, UE ou outro instrumento similar. Sabemos que eventuais medidas dessa natureza não se converterão em ajuda aos povos; a história recente mostra que os beneficiários, de fato, serão as organizações financeiras, que continuarão, assim, assegurando níveis extorsivos de lucratividade. Tal medida não combate a crise, mas a aprofunda, visto que os pacotes de “ajuda” impõem recessões, desemprego e redução de gastos sociais.

Adicione-se que os recursos que o Brasil eventualmente possa destinar a tais pacotes nefastos são obtidos por meio de mais “dívida interna”, sobre a qual incidem as mais altas taxas de juros do mundo. Esta é a pior forma possível de “combater” a crise, pois faz a população brasileira pagar caro para financiar programas que sacrificam ainda mais a população européia.

Outra aplicação das reservas brasileiras é a compra de títulos do Tesouro dos EUA, que não rendem quase nada e ainda financiam as políticas estadunidenses, como o salvamento de bancos falidos e as guerras.

Todos esses pontos mostram a necessidade de uma nova arquitetura financeira internacional, em que a lógica não seja aquela em que os povos dos países periféricos financiem os impérios. Esta nova arquitetura financeira passa pela efetiva criação do Banco do Sul, orientado para o investimento em projetos que atendam às necessidades dos povos, e não das grandes empresas transnacionais.
Essa instituição deve ser controlada, portanto, por organismos representativos da sociedade civil, voltados à defesa dos direitos humanos fundamentais, dos interesses coletivos, da sustentabilidade ambiental e da autonomia dos povos. Somente com essa integração democrática será possível escapar às amarras impostas pelo estado capitalista, sujeito às determinações ditas “dos mercados”, sabidamente incompatíveis com o desenvolvimento social.
Neste sentido, as entidades presentes rechaçam todo e qualquer instrumento de dominação dos povos a serviço das grandes empresas transnacionais, e proclamaram:

- NÃO ao projeto da Estrada Villa Tunari – San Ignacio de Moxos, na Bolivia, que conta com financiamento do BNDES do Brasil. Esta estrada atravessa o Território Indígena do Parque Nacional Isiboro Sécure (TIPNIS), e gerará destruição ecológica e afetará a vida e a cultura dos povos indígenas. As entidades solidarizam-se com os pronunciamentos das Redes Latindadd e outras contra este projeto.

- NÃO à atuação do CIADI (Centro Internacional para a Arbitragem de Disputas sobre Investimentos), cujas decisões favorecem as transnacionais em detrimento dos povos. Os países da América Latina devem se retirar deste organismo e avançar na implementação da Nova Arquitetura Financeira Internacional;

- NÃO à promoção de projetos que aumentam a dívida ecológica, a difusão de um modelo agrícola baseado em monoculturas e agrotóxicos – que envenenam o ambiente 

– enquanto os camponeses permanecem abandonados, sem reforma agrária;

- NÃO à presença de tropas brasileiras no Haiti, que servem à manutenção de um modelo neoliberal de exploração da classe trabalhadora.
Ante todo o exposto, as entidades reivindicam:

- a suspensão imediata dos programas neoliberais impostos pelo FMI, União Européia e governos aos povos europeus, e a suspensão do pagamento das dívidas feitas para salvar o setor financeiro e sustentar o lucro de grandes empresas;

- uma nova arquitetura financeira internacional, que privilegie não o setor financeiro do Norte, mas o conjunto dos povos e sua parcela majoritária, que depende de investimentos públicos capazes de desenvolver políticas de emprego e salários dignos e de produzir serviços satisfatórios, como nas áreas de saúde e educação;

- a completa auditoria das dívidas do Sul e do Norte, que dará aos povos uma importante ferramenta para derrotar este verdadeiro “sistema da dívida”, o qual promove a apropriação das riquezas globais e a submissão de enormes fatias populacionais do planeta em benefício de uma elite capitalista, empresarial e financeira. Para tanto, as entidades internacionais presentes elaborarão um manual de auditorias da dívida, direcionado tanto aos especialistas como também aos movimentos sociais.

- a democratização das decisões de política econômica para o enfrentamento da crise, expressa em suas facetas alimentar, ambiental, financeira e social, o que será possível somente a partir do amplo conhecimento dos fatores de poder que impedem o pleno acesso aos direitos consagrados nas diversas ordens constitucionais e no direito internacional.

Brasília, 5 de outubro de 2011

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

O Analfabeto Político



"O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão,
do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia
a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta,
o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista,
pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo."
Nada é impossível de Mudar
"Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de
hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem
sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural
nada deve parecer impossível de mudar."
Privatizado
"Privatizaram sua vida, seu trabalho, sua hora de amar e seu direito de pensar.
É da empresa privada o seu passo em frente,
seu pão e seu salário. E agora não contente querem
privatizar o conhecimento, a sabedoria,
o pensamento, que só à humanidade pertence."

Bertolt Brecht

terça-feira, 4 de outubro de 2011

DESASTRES NATURAIS: as enchentes e deslizamentos em Blumenau e Vale do Itajaí.

As enchentes em Blumenau
Por Elaine Tavares – jornalista
            [.....]
 
          Quem também esteve ilhada por alguns dias foi a professora Catarina Gewehr. Morando no quarto andar ela não teve nada de seus pertences tocado pelas águas, mas, do alto da janela, sem luz, sem água, viveu o que descreve como um sentimento de “total desolação”. Catarina conta que para onde quer que olhasse ali estava a água, tomando toda a região próxima à FURB. “Foi a primeira vez que vivi uma enchente aqui em Blumenau. Não dá medo, não dá pavor, o que dá isso mesmo, uma profunda desolação. E é o que a gente vê nos olhos das pessoas por toda a cidade. Quando a água baixou e eu saí para a rua, tentando ajudar, esse era o sentimento que eu via em toda a gente. Desolação e resignação. Como se aquilo tudo fosse coisa natural, triste, mas natural”.
           
          Na região de Blumenau, antes de chegarem os colonizadores alemães, viviam os Xokleng e os Kaigangs. Eram comunidades coletoras, de cultura simples, mas conhecedoras dos segredos da natureza da região. Como era comum aos indígenas da época, nos tempos de chuva eles se moviam para longe dos rios, pois sabiam que as divindades das águas avançariam pela terra afora, tornando fértil o vale e fazendo com que nascessem mais bonitos os frutos locais. A relação com a natureza era de conhecimento profundo e harmonia. Mas, todo esse equilíbrio se quebrou com a chegada dos primeiros imigrantes, trazidos para o Brasil com o objetivo de colonizar os “lugares vazios”. Só que esses lugares não estavam vazios e o processo que introduziu o homem branco – a maioria de famílias alemãs e italianas – foi de violenta destruição dos povos autóctones. Não bastasse o genocídio, as famílias que chegavam, no sonho de uma vida melhor, foram fincando raízes nas margens dos rios, expondo-se elas mesmas aos caprichos das divindades aquáticas.
Quando em 1850, o doutor Hermann Blumenau chegou ao vale para fundar uma comunidade, ninguém imaginava que o lugar iria protagonizar, sistematicamente, longas batalhas com o grande rio (Itajaí-açu). A primeira delas já foi no ano de 1852, quando, no mês de novembro, o rio passou dos 16 metros (a maior cheia até agora), segundo dados do Centro de Operação do Sistema de Alerta (CEOPS), da FURB (Universidade de Blumenau). Desde aí, até o ano de 2005 foram contabilizadas 68 enchentes, ficando de fora a tremenda tragédia de 2008, quando a cidade praticamente ruiu, e a última, do mês de setembro de 2011.

             O que parece intrigante é que, se desde os primeiros anos da colonização até hoje, as enchentes se sucedem, por que não houve e nem há uma prevenção efetiva, de não ocupação das margens, para que as famílias não tenham de viver cotidianamente os horrores do alagamento? Ainda segundo o CEOPS, historicamente, sempre que acontecia um grande desastre por conta das águas, como nos anos de 1911, 1927, 1957 e 1983, o poder público discutia com mais afinco a questão, inclusive propondo medidas de prevenção. Mais isso só fervilhava no pequeno período pós-enchente, arrefecendo na medida em que a cidade voltava à vida normal. Assim, o que os pesquisadores da FURB observam é que, apesar do impacto das tragédias, a população e o poder público tendem a manter inalterada a disposição de usufruir das medidas de defesa contra as enchentes, porque, afinal, não querem arcar com os ônus políticos/econômicos/culturais que isso acarreta.

             No que diz respeito aos morros também já existem dezenas de estudos que comprovam a fragilidade destes espaços na região – com alguns deles propensos a deslizar mesmo sem ocupação humana - e ainda assim os morros seguem sendo ocupados, com as pessoas sequer sabendo desse “detalhe”, uma vez que a própria mídia acaba não cumprindo o seu papel de divulgar esses estudos. Se houvesse uma política de informação, muitas famílias desistiram de comprar uma casa ou um sítio em lugares vulneráveis, ou ainda, lugares vulneráveis não seriam vendidos. Mas, os estudos feitos sobre enchentes ou deslizamentos só aparecem, re-nascidos das gavetas empoeiradas, sempre depois dos desastres, e para as gavetas voltam assim que a população vai retomando seu cotidiano.

           Segundo o engenheiro florestal, e pesquisador do CEOPS/FURB, Julio Refosco, a cidade tem a seu dispor soluções estruturais, tais como canalizações, reflorestamento, recuperação das matas ciliares nas margens do rio. Mas estas são consideradas muito caras. Para se ter uma idéia, tão logo a cidade se recuperou da enchente de 1983, em 1986 foi finalizado um mapa, chamado de primeira carta-enchente, no qual estão bem delimitadas as áreas que são atingidas assim que o rio chega aos 8 metros. Esse seria um instrumento que deveria nortear as políticas públicas de longo prazo, mas acaba não sendo levado em conta.  Julio lembra o exemplo de Curitiba que decidiu criar parques ciliares nas margens dos rios, fazendo assim um trabalho de longo prazo, mas verdadeiramente preventivo.

          No caso de Blumenau sabe-se que esse tipo de ação seria bastante complicado. Há muita gente morando nas áreas próximas ao rio, seriam necessárias muitas desapropriações e, numa cidade onde o poder público não tem um plano bem claro para o desalojo, fica bem difícil para as famílias aceitarem sair do lugar onde vivem desde há gerações. Mas a pergunta que não cala é: o que acaba sendo mais caro, realocar as famílias ou viver essa tragédia a cada dois, três anos?  Julio Refosco concorda que talvez fosse mais vantajoso para a sociedade blumenauense apostar numa solução de longo prazo, com uma mudança radical na estrutura da própria cidade, mas também argumenta o quanto isso pode ser difícil considerando a realidade concreta das pessoas.

        Na enchente desse mês de setembro, quando o rio chegou a 12 metros, as áreas atingidas foram bem maiores do que as da carta-enchente de 1986 e novos instrumentos deverão ser construídos a partir dessa realidade. Mas, outros problemas se avolumam na margem ocupada do rio, como é o caso da margem esquerda. Ali, além da invasão das águas, quando o rio cresce, está acontecendo o problema da instabilidade do terreno. Quando em 1990 a região passou por obras paliativas da enchente, houve uma canalização do rio. Isso fez com que as águas aumentassem de velocidade, retirando sedimentos das margens e causando instabilidade. Um exemplo típico de uma intervenção emocional, sem visão de longo prazo. “Medidas como muro de contenção, por exemplo, não são indicadas, porque acabam provocando problemas ainda maiores” diz Refosco. Ele também avalia que proteger as margens do rio com vegetação seria o mais adequado. “É certo que isso não é coisa para se fazer num ano, precisaria de um programa de no mínimo 50 anos, para retirada gradual de casas e construção de parques. Isso teria de ser um programa que envolvesse educação ambiental, reordenamento geral da vida, uma coisa muito mais ampla do que tomar medidas emergenciais”.

            O fato é que, como ensina a escritora canadense Naomi Klein, existe sempre um grupo bem pequeno de pessoas que lucra muito com a “política do desastre”. Quando ocorrem catástrofes de destruição de cidades, logo vêm as empresas de reconstrução que movimento milhares de reais em materiais, cimento, etc... Há gente que lucra muito com a desgraça alheia. Talvez seja por isso que os instrumentos de conhecimento que a cidade já produziu através de seus cientistas e pesquisadores permaneçam escondidos nas gavetas. Ou isso ou os administradores estão falhando, como bem lembra a professora Catarina. “Não dá para a gente viver acreditando que isso é natural. O poder público tem que se responsabilizar por essa situação. Tem que propor saídas concretas e não paliativas. Os estudos existem. Há todo um contingente de pesquisadores que produzem informação de qualidade, que propõe soluções. Mas não são levados em conta”. Ela lembra a própria Universidade de Blumenau, que tem uma histórica produção sobre as enchentes. Se as soluções definitivas requerem um redesenho na cidade isso deveria ser encarado como uma possibilidade, senão de agora, pelo menos do futuro. Um bom planejamento e vontade política podem mudar essa dinâmica de tragédia atrás de tragédia.

          Por outro lado há que haver também um compromisso dos sindicatos e movimentos sociais da cidade em fazer esse debate de maneira mais profundo. O sistema capitalista de exploração da natureza já deu mostras do seu esgotamento. Ou se pensa a cidade de forma a atuar em harmonia com a natureza, ou ela vai seguir seu curso. E aí não será possível chamar a tragédia de uma desgraça natural. Ela é fruto da forma de ocupação pela qual se optou desde os tempos do Dr. Blumenau. A cidade está então colocada entre a cruz e a caldeirinha. Ou aceita a lógica de destruição/reconstrução permanente, ou se repensa, assentada em outra lógica, de uma vida segura em relação harmônica com o grande rio.

          Segundo informações da CEOPS a prefeitura já chamou os pesquisadores para a feitura de uma nova carta-enchente, para saber quais espaços da cidade são alagados a 8, 9, e 12 metros. E o que se espera é que, em posse desses dados, a comunidade blumenauense, informada, possa decidir sobre seu futuro.

          Agora vem aí mais uma Oktoberfest, a famosa festa que recebe turistas de todo o país. E, por conta dela, as ruas do centro e da região dos pavilhões já estão como novas, limpas e belas. As pessoas da cidade, conhecidas por sua fortaleza, se colocam em pé.  Isso é bom, movimenta o turismo, traz dinheiro para a cidade, levanta a auto-estima. Mas, lá na frente, novas chuvas cairão, e o rio seguirá seu curso. Talvez fosse hora também de reinventar a cidade para que ali, sua gente pudesse bem-viver, sempre, e não só nos dias de festa.

fonte>Disponível em: http://www.iela.ufsc.br/?page=noticia&id=1829, acesso em 04-10-11

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

NA LUTA PELA EDUCAÇÃO.

MANIFESTO PELO FIM DO VESTIBULAR

Precisamos unir forças, e lutar pela educação de todos e todas, pois ela é um direito. E entendemos a educação para toda a vida, como formação humana, e não para atender as necessidades imediatas do mercado de trabalho.
                Desta forma, somar forças, no sentido de que as garantias à educação sejam asseguradas a tod@s que desejarem estudar no ensino superior é uma das formas de acabarmos com o mercado que se formou em torno do vestibular.
                Pois o mesmo, não mede conhecimento, se não, a quantidade de coisas absurdas que os estudantes têm de decorar, para reproduzir num único dia de vestibular (alguns casos dois ou três dias desgastantes) não seria esquecido no dia seguinte. Depois do período de provas, acaba-se esquecendo, pois nada mais é que uma decoreba, aos moldes do nosso ensino básico. Decoramos tudo, tiramos as notas, passamos. Mas, hoje, não temos CONHECIMENTO.
                Quanto aos trabalhadores estudantes, que tem uma jornada de trabalho excessiva, condições precárias, baixos salários, a educação universitária é uma realidade e privilégio para poucos, que se dispõem a lutar para conseguir o ensino superior. E depois servem de propaganda para a elite-alienada-neomalthusiana-burguesa-positivista justificar, “é só se esforçar que consegue!”
                Temos aqui um processo excludente da classe trabalhadora, pois teve seu ensino básico em escolas públicas, e agora, fica fora dos bancos universitários. Pois não tem tempo para decorar todas as coisas, coisas essas, que depois desses dias de angustias (as provas) nunca mais lhe servirá para a vida, o dia a dia. Apenas os conhecimentos que levará, será aquele que escolheu para sua formação como ser humano, o do cotidiano.
                De acordo com o lingüista Marcos Bagno, em seu livro “preconceito linguístico”, já passou da hora de acabarmos com a entidade vestibular. Segundo Bagno “Com o fim do vestibular, desaparecerá também – assim esperamos ardentemente – toda a indústria que se formou em torno dele: os nefandos cursinhos onde ninguém aprende nada, onde não há nenhuma produção de conhecimento, mas apenas reprodução de informações desconexas, onde centenas de alunos (e não estudantes) se apinham numa sala, onde tudo o que se faz é entupir a cabeça do aluno com truques e macetes que em nada contribuem para a sua verdadeira formação intelectual e humanística” (p.147 – grifo meu)
                Agora, imagine você estudante do PROJETO INTEGRAR, como seria sua educação básica, com a equipe do INTEGRAR? Com vocês um momento para pensar.
                Lutaremos para que a educação seja direito de todos e todas? Que seja formação para vida, de livre acesso aos bancos universitários? Que seja emancipadora?
                Ou, continuaremos pensando única e exclusivamente na nossa vidinha medíocre, individualista, egoísta e capitalista?
Kleicer
Educador popular.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

AULÃO DEBATE do filme O SENHOR DAS ARMAS. PROJETO INTEGRAR.


No sábado dia 17-09-11 tivemos AULÃO DEBATE do filme O SENHOR DAS ARMAS.

Com a participação dos professores debatedores do Projeto INTEGRAR:

KLEICER - GEO - ATUALIDADES - INTERPRETAÇÃO DA REALIDADE BRASILEIRA
KIKA - HIST - ATUALIDADES - INTERPRETAÇÃO DA REALIDADE BRASILEIRA
LUCIANA - ACADÊMICA DE CIÊNCIAS SOCIAIS DA UFSC
BIANCA – BIOLOGIA

CONTAMOS com A PARTICIPAÇÃO DA EQUIPE INTEGRAR, DO PROFESSOR Luis Henrique de Matemática, na qual nos ajudou com os fios para termos o som, com a participação do professor Robson de Literatura, participando no debate com questionamentos.

Nossas atividades de aulões estão para além de simples conteúdos de vestibular, pois queremos muito mais, proporcionar acesso ao CINEMA. É uma das formar de participarmos ativamente na vida de nossos estudantes, haja vista, que o mesmo é de acesso de pouco mais de 10 milhões de brasileiros e brasileiras, quando temos cerca de 192 milhões de habitantes em nosso país. Aí podemos ver a desigualdade de acesso a uma das formas de lazer e cultura.

Depois de assistirmos o filme O Senhor das Armas e de muita comilança – Ben Hur alegrou a galera com seus docinhos deliciosos e melequentos -, os estudantes juntos aos professores debatedores travaram um intenso trocar de idéias e questionamentos sobre o mundo que vivemos. As questões da Guerra Quente, como bem colocou Kika em sua intervenção, o função da ONU e seu servilismo ao Imperialista EUA, o Conselho de Segurança da ONU, composto por 5 países (EUA, Reino Unido, França, China e Rússia), na qual também são os maiores produtores e distribuidores de armas e munições no Mundo.

Como debater idéias é muito gostoso, os assuntos vão e vem, e assim os estudantes questionaram sobre Cuba, sempre Cuba, como amo Cuba, por existir já faz o mundo pensar, por que existe Cuba, uns odiando por existir, EU amando por existir. Sobre o “ditador da Venezuela”, meu querido Hugo Chávez, será por que estava usando uma camiseta do Hugo Chávez, despertou algo nos estudantes, que tem uma visão única e hegemônica passada pela mídia monopolista e capetalista? Assim, podemos falar, discordar, acreditar, desconstruir o discurso da Rede Globo.

Tivemos a participação da Luciana de Freitas, com seus conhecimentos construídos também nesse projeto comunitário da qual faz parte a quatro anos, descrevendo experiência própria de como foi construir seus argumentos, a partir de duas fontes diferentes, a Veja – abominável – e a Caros Amigos. Sempre é muito bom ouvir a Luciana falar, representa toda nossa utopia de sociedade, na qual estamos lutando nesse Projeto Integrar. Parabéns Luciana.

Por fim, tivemos a participação da professora Bianca, sempre parceira das nossas atividades, pesquisou, leu, e se dedicou a apresentar para os estudantes os efeitos das drogas no nosso organismo. Destacando as drogas lícitas e ilícitas, como causa o vício e seus males.

Agradecemos a todos e todas que participaram, obrigado Kika, Bianca, Luciana, Luis Henrique, Robson e a todos os nossos estudantes.

Kleicer –
educador popular da Escola dos Trabalhadores e Projeto INTEGRAR.

Obs – texto para complementar seus estudos: http://www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/egg/v14n1/v14n1a07.pdf

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

LUTA PELA EDUCAÇÃO EM FLORIANÓPOLIS - ABAIXO ASSINADO.

Dia Internacional da Alfabetização e o Dia Municipal da EJA em Florianópolis

          No dia 8 de setembro se comemora o Dia Internacional da Alfabetização e o Dia Municipal da EJA em Florianópolis conforme decisão recente da Câmara dos Vereadores, porém a realidade da Educação de Jovens e Adultos de Florianópolis está débil e tem que mudar. 
        O atual governo municipal resolveu interromper um tênue movimento de contratação de professores efetivos por considerar que isto não se relaciona diretamente com a melhoria da qualidade da Educação. 
        
          Prossiga a leitura e confira um pouco da realidade interna da educação da rede de Florianópolis e veja os motivos de nosso ABAIXO-ASSINADO.


 No período de 2006 a 2009, dos 289 professores que trabalharam na EJA de Florianópolis apenas 1,7% eram efetivos. Ou seja 98,3% contratados em caráter temporário de onze meses.(nenhum da área de educação física). A média anual de retorno dos professores que atuaram no ano anterior é de 36,9%. Portanto, praticamente dois terços não retornam à EJA no ano seguinte e isto tem se repetido anualmente conforme nossa pesquisa.
 Em 2009, 50,9% não haviam trabalhado antes na EJA, pelo menos no período de 2006 a 2008. Ainda por cima, interromperam a "formação continuada inicial" (antes de começar as aulas) e a "formação continuada continuada" está precária e esporádica.

      Com este quadro e sabedores que Educação de Qualidade se faz com quadros efetivos, boa formação inicial e continuada, bons salários, boas condições de trabalho e com valorização profissional, vimos pedir ajuda de todos para pressionar a reversão desse panorama na EJA de Florianópolis.

     Assim, conforme decisão da última reunião do Fórum Municipal da EJA de Florianópolis - FEJAFLORIPA, em 02 de setembro de 2011, passamos o link do abaixo-assinado para a realização de concurso público na EJA de Florianópolis para reivindicar Concurso Público tanto para professores como para auxiliares na EJA de Florianópolis.

 http://www.peticaopublica.com.br/?pi=EJA2011

       A EJA agradece.
- texto escrito por José Manoel -

domingo, 7 de agosto de 2011

BEM VINDOS A LUTA COMPANHEIR@S.

PROJETO DE EDUCAÇÃO COMUNITÁRIA INTEGRAR.
EDUCAÇÃO FEITA COM PAIXÃO
CADA CORAÇÃO É UMA CÉLULA COMUNITÁRIA REVOLUCIONÁRIA.

terça-feira, 5 de julho de 2011

ABERTAS AS INSCRIÇÕES PARA O SEMI NO CURSINHO COMUNITÁRIO

PRÉ UNIVERSITÁRIO COMUNITÁRIO FLORIPA 2011

ESTÃO ABERTAS AS INSCRIÇÕES PARA O SEMI NO CURSINHO COMUNITÁRIO

INSCRIÇÕES ON LINE NO SÍTIO DO CURSINHO: www.pvcfloripa.tk

......DIVULGUEM PARA OS AMIGOS DOS AMIGOS DOS AMIGOS DOS AMIGOS

EDUCAÇÃO É UM DIREITO DE TOD@S. E TEM QUE SER GRATUITA.

KLEICER

quarta-feira, 1 de junho de 2011

AULÃO CURSINHO PRÉ UNIVERSITÁRIO COMUNITÁRIO 2011


AULÃO DO CURSINHO PARA VESTIBULAR DA UDESC.

DIA: SÁBADO 04-06-2011

LOCAL: AUDITÓRIO DA ESCOLA INSTITUTO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO
...RUA MAURO RAMOS.

HORÁRIO: DAS 13:45H ÀS 18:30H

TODAS AS DISCIPLINAS PRESENTES.

PARTICIPE.

ABERTO A TODA COMUNIDADE ESTUDANTIL.

CONTATO: kleicer@gmail.com

sexta-feira, 20 de maio de 2011

na Espanha, a REVOLUÇÃO da Porta do Sol

Internacional| 20/05/2011 | Copyleft

Cresce na Espanha a Revolução dos Indignados

O movimento que iniciou no dia 15 de maio, chamado 15-M ou a “revolução espanhola”, cresceu quinta-feira com panelaços que reuniram multidões em dezenas de cidades de todo o país para exigir a mudança de um sistema que consideram injusto. A revolta cresce a cada hora. Começou com uma convocatória nas redes sociais e internet para repudiar a corrupção endêmica do sistema e a falta de oportunidades para os mais jovens. A também chamada Revolução dos Indignados acusa, pela situação atual, o FMI, a OTAN, a União Europeia, as agências de classificação de risco, o Banco Mundial e, no caso da Espanha, os dois grandes partidos: PP e PSOE. O artigo é de Armando G. Tejeda, do La Jornada.

Armando G. Tejeda – La Jornada, na Carta Maior

A Junta Eleitoral Central da Espanha proibiu em todo o país qualquer manifestação desde a zero hora de sábado até às 24 horas de domingo, dia das eleições municipais, em uma clara alusão às mobilizações do movimento cidadão Democracia Real Já que, desde o último domingo, ocorrem em repúdio ao modelo político e econômico vigente e que já se espalharam em escala nacional.

Alfredo Peréz Rubalcaba, ministro do Interior, declarou que o governo só esperava o pronunciamento da junta eleitoral para decidir se ordena à polícia dispersar os manifestantes. Enquanto isso, milhares de cidadãos indignados na Porta do Sol, em Madri, na Praça da Catalunha, em Barcelona, na Praça do Pilar, em Zaragoza, e no Parasol da Encarnação, em Sevilla, entre outras, voltaram a romper o cerco policial e, uma vez mais, repudiaram a política, banqueiros e empresários.

O movimento que iniciou no dia 15 de maio, chamado 15-M ou a “revolução espanhola”, cresceu quinta-feira com panelaços que reuniram multidões em dezenas de cidades de todo o país para exigir a mudança de um sistema que consideram injusto. A revolta cresce a cada hora. Começou com uma convocatória nas redes sociais e internet para repudiar a corrupção endêmica do sistema e a falta de oportunidades para os mais jovens e acabou se estendendo para a comunidade espanhola na Itália, Inglaterra, Estados Unidos e México, entre outros países.

No quinto dia de mobilizações a afluência aumentou sensivelmente, sobretudo em Madri e Barcelona, onde dezenas de milhares entoaram palavras de ordem durante horas. Uma delas advertia: se vocês não nos deixam sonhar, nós não os deixaremos dormir.

Os manifestantes desenvolveram métodos de organização através de comissões por setores – saúde, alimentação, meios de comunicação, etc. -, que decidem cada atividade. Nas assembleias gerais decide-se a estratégia e busca-se uma mensagem política unificada que mostrem as principais razões de descontentamento e protesto. Na quinta-feira, por exemplo, decidiu-se manter a mobilização até o próximo domingo, quando ocorrem as eleições locais, e, o mais importante, confirmar a convocatória para a manifestação deste sábado.

Mais tarde, a Junta Eleitoral Central declarou ilegais as concentrações, ao considerar que elas não se ajustam à lei eleitoral e excedem o direito de manifestação garantido constitucionalmente. De fato, desde o início da semana, todas as mobilizações, concentrações e marchas da “revolução espanhola” foram declaradas ilegais pela Junta Eleitoral de Madri. Em resposta, o número de indignados se multiplicou.

Depois de conhecer a decisão da Junta Eleitoral Central, o movimento cidadão decidiu simplesmente manter o acampamento, ao mesmo tempo em que ecoou um grito unânime: não nos tirarão daqui, vamos ganhar esta revolução. Em seguida, foi lido o manifesto original do movimento em uma dezena de idiomas. O texto aponta a classe política e os meios de comunicação eletrônicos como os grandes aliados dos agentes financeiros, os causadores e grandes beneficiários da crise. Advertem que é preciso um discurso político capaz de reconstruir o tecido social, sistematicamente enfraquecido por anos de mentiras e corrupção. “Nós, cidadãos, perdemos o respeito pelos partidos políticos majoritários, mas isso não equivale a perder nosso sentido crítico. Não tememos a política. Tomar a palavra é política. Buscar alternativas de participação cidadã é política”.

A também chamada Revolução dos Indignados acusa, pela situação atual, o Fundo Monetário Internacional, a Organização do Tratado do Atlântico Norte, a União Europeia, as agências de classificação de risco, o Banco Mundial e, no caso da Espanha, os dois grandes partidos: o direitista Partido Popular (PP) e o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), de centro-esquerda.

A reação da direita

Desde a esquerda, há tentativas de aproximação aos indignados. O líder do governo, José Luis Rodríguez Zapatero, disse que é preciso escutar e ter sensibilidade porque há razões para a expressão desse descontentamento e dessa crítica. O líder da Esquerda Unida, Cayo Lara, defendeu o fim da submissão e do bipartidarismo, propiciado pela atual lei eleitoral.

Mas o setor duro da direita política e midiática reclamou com insistência a atuação policial para acabar com todas as mobilizações, sobretudo na Porta do Sul, e pediu inclusive ao Ministério do Interior para que adotasse meios violentos para assegurar esse fim. Uma das imagens do dia (quinta-feira) foi a do ex-ministro da Defesa durante o governo de José María Aznar, Federico Trillo, insultando com o dedo um grupo de cidadãos da revolução dos indignados.

As desqualificações mais fortes vieram, porém, dos meios de comunicação conservadores e da televisão pública de Madri, que acusaram o movimento de ser comunista, socialista, antissistema e de ter relação com o ETA. Um dos ideólogos da direita, César Vidal, foi mais além e depois de chamar, depreciativamente os manifestantes de “perroflautas” (tribo urbana também conhecida como ‘pés pretos’, formada por punks, anarquistas, hippies e ‘gente desocupada’), assegurou que estes jovens mantém contato regular com o Batasuna-ETA e que receberam cursos de guerrilha urbana, da Segi (organização de juventude da esquerda basca).

O movimento cidadão tem seu próprio canal de televisão, que transmite sem cessar as imagens da Porta do Sul (www.solttv.tv).

Tradução: Katarina Peixoto

http://www.viomundo.com.br/politica/ao-vivo-na-espanha-a-revolucao-da-porta-do-sol.html

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Quatro mentiras sobre o ambiente

por Eduardo Galeano


1- Somos todos culpados pela ruína do planeta.


A saúde do mundo está feito um caco. “Somos todos responsáveis”, clamam as vozes do alarme universal, e a generalização absolve: se somos todos responsáveis, ninguém é. Como coelhos, reproduzem-se os novos tecnocratas do meio ambiente. É a maior taxa de natalidade do mundo: os experts geram experts e mais experts que se ocupam de envolver o tema com o papel celofane da ambiguidade.


Eles fabricam a brumosa linguagem das exortações ao “sacrifício de todos” nas declarações dos governos e nos solenes acordos internacionais que ninguém cumpre. Estas cataratas de palavras – inundação que ameaça se converter em uma catástrofe ecológica comparável ao buraco na camada de ozônio – não se desencadeiam gratuitamente. A linguagem oficial asfixia a realidade para outorgar impunidade à sociedade de consumo, que é imposta como modelo em nome do desenvolvimento, e às grandes empresas que tiram proveito dele. Mas, as estatísticas confessam. Os dados ocultos sob o palavreado revelam que 20% da humanidade comete 80% das agressões contra a natureza, crime que os assassinos chamam de suicídio, e é a humanidade inteira que paga as consequências da degradação da terra, da intoxicação do ar, do envenenamento da água, do enlouquecimento do clima e da dilapidação dos recursos naturais não-renováveis. A senhora Harlem Bruntland, que encabeça o governo da Noruega, comprovou recentemente que, se os 7 bilhões de habitantes do planeta consumissem o mesmo que os países desenvolvidos do Ocidente, “faltariam 10 planetas como o nosso para satisfazerem todas as suas necessidades”. Uma experiência impossível. Mas, os governantes dos países do Sul que prometem o ingresso no Primeiro Mundo, mágico passaporte que nos fará, a todos, ricos e felizes, não deveriam ser só processados por calote. Não estão só pegando em nosso pé, não: esses governantes estão, além disso, cometendo o delito de apologia do crime. Porque este sistema de vida que se oferece como paraíso, fundado na exploração do próximo e na aniquilação da natureza, é o que está fazendo adoecer nosso corpo, está envenenando nossa alma e está deixando-nos sem mundo.


2- É verde aquilo que se pinta de verde.


Agora, os gigantes da indústria química fazem sua publicidade na cor verde, e o Banco Mundial lava sua imagem, repetindo a palavra ecologia em cada página de seus informes e tingindo de verde seus empréstimos. “Nas condições de nossos empréstimos há normas ambientais estritas”, esclarece o presidente da suprema instituição bancária do mundo. Somos todos ecologistas, até que alguma medida concreta limite a liberdade de contaminação. Quando se aprovou, no Parlamento do Uruguai, uma tímida lei de defesa do meio-ambiente, as empresas que lançam veneno no ar e poluem as águas sacaram, subitamente, da recém-comprada máscara verde e gritaram sua verdade em termos que poderiam ser resumidos assim: “os defensores da natureza são advogados da pobreza, dedicados a sabotarem o desenvolvimento econômico e a espantarem o investimento estrangeiro.”


O Banco Mundial, ao contrário, é o principal promotor da riqueza, do desenvolvimento e do investimento estrangeiro. Talvez, por reunir tantas virtudes, o Banco manipulará, junto à ONU, o recém-criado Fundo para o Meio-Ambiente Mundial. Este imposto à má consciência vai dispor de pouco dinheiro, 100 vezes menos do que haviam pedido os ecologistas, para financiar projetos que não destruam a natureza. Intenção inatacável, conclusão inevitável: se esses projetos requerem um fundo especial, o Banco Mundial está admitindo, de fato, que todos os seus demais projetos fazem um fraco favor ao meio-ambiente. O Banco se chama Mundial, da mesma forma que o Fundo Monetário se chama Internacional, mas estes irmãos gêmeos vivem, cobram e decidem em Washington. Quem paga, manda, e a numerosa tecnocracia jamais cospe no prato em que come. Sendo, como é, o principal credor do chamado Terceiro Mundo, o Banco Mundial governa nossos escravizados países que, a título de serviço da dívida, pagam a seus credores externos 250 mil dólares por minuto, e lhes impõe sua política econômica, em função do dinheiro que concede ou promete. A divinização do mercado, que compra cada vez menos e paga cada vez pior, permite abarrotar de mágicas bugigangas as grandes cidades do sul do mundo, drogadas pela religião do consumo, enquanto os campos se esgotam, poluem-se as águas que os alimentam, e uma crosta seca cobre os desertos que antes foram bosques.


3- Entre o capital e o trabalho, a ecologia é neutra.


Poder-se-á dizer qualquer coisa de Al Capone, mas ele era um cavalheiro: o bondoso Al sempre enviava flores aos velórios de suas vítimas… As empresas gigantes da indústria química, petroleira e automobilística pagaram boa parte dos gastos da Eco-92: a conferência internacional que se ocupou, no Rio de Janeiro, da agonia do planeta. E essa conferência, chamada de Reunião de Cúpula da Terra, não condenou as transnacionais que produzem contaminação e vivem dela, e nem sequer pronunciou uma palavra contra a ilimitada liberdade de comércio que torna possível a venda de veneno. No grande baile de máscaras do fim do milênio, até a indústria química se veste de verde. A angústia ecológica perturba o sono dos maiores laboratórios do mundo que, para ajudarem a natureza, estão inventando novos cultivos biotecnológicos. Mas, esses desvelos científicos não se propõem encontrar plantas mais resistentes às pragas sem ajuda química, mas sim buscam novas plantas capazes de resistir aos praguicidas e herbicidas que esses mesmos laboratórios produzem. Das 10 maiores empresas do mundo produtoras de sementes, seis fabricam pesticidas (Sandoz-Ciba-Geigy, Dekalb, Pfizer, Upjohn, Shell, ICI). A indústria química não tem tendências masoquistas.


A recuperação do planeta ou daquilo que nos sobre dele implica na denúncia da impunidade do dinheiro e da liberdade humana. A ecologia neutra, que mais se parece com a jardinagem, torna-se cúmplice da injustiça de um mundo, onde a comida sadia, a água limpa, o ar puro e o silêncio não são direitos de todos, mas sim privilégios dos poucos que podem pagar por eles. Chico Mendes, trabalhador da borracha, tombou assassinado em fins de 1988, na Amazônia brasileira, por acreditar no que acreditava: que a militância ecológica não pode divorciar-se da luta social. Chico acreditava que a floresta amazônica não será salva enquanto não se fizer uma reforma agrária no Brasil. Cinco anos depois do crime, os bispos brasileiros denunciaram que mais de 100 trabalhadores rurais morrem assassinados, a cada ano, na luta pela terra, e calcularam que quatro milhões de camponeses sem trabalho vão às cidades deixando as plantações do interior. Adaptando as cifras de cada país, a declaração dos bispos retrata toda a América Latina. As grandes cidades latino-americanas, inchadas até arrebentarem pela incessante invasão de exilados do campo, são uma catástrofe ecológica: uma catástrofe que não se pode entender nem alterar dentro dos limites da ecologia, surda ante o clamor social e cega ante o compromisso político.


4- A natureza está fora de nós.


Em seus 10 mandamentos, Deus esqueceu-se de mencionar a natureza. Entre as ordens que nos enviou do Monte Sinai, o Senhor poderia ter acrescentado, por exemplo: “Honrarás a natureza, da qual tu és parte.” Mas, isso não lhe ocorreu. Há cinco séculos, quando a América foi aprisionada pelo mercado mundial, a civilização invasora confundiu ecologia com idolatria. A comunhão com a natureza era pecado. E merecia castigo. Segundo as crônicas da Conquista, os índios nômades que usavam cascas para se vestirem jamais esfolavam o tronco inteiro, para não aniquilarem a árvore, e os índios sedentários plantavam cultivos diversos e com períodos de descanso, para não cansarem a terra. A civilização, que vinha impor os devastadores monocultivos de exportação, não podia entender as culturas integradas à natureza, e as confundiu com a vocação demoníaca ou com a ignorância. Para a civilização que diz ser ocidental e cristã, a natureza era uma besta feroz que tinha que ser domada e castigada para que funcionasse como uma máquina, posta a nosso serviço desde sempre e para sempre. A natureza, que era eterna, nos devia escravidão. Muito recentemente, inteiramo-nos de que a natureza se cansa, como nós, seus filhos, e sabemos que, tal como nós, pode morrer.

*Artigo publicado pelo blog Outras Palavras.

Disponível em: http://operamundi.uol.com.br/conteudo/opiniao/QUATRO+MENTIRAS+SOBRE+O+AMBIENTE_1497.shtml